O mundo BDSM

Segue abaixo uma interessante entrevista dada à Revista Paradoxo pelo amigo Mestre K@:

Uma visão sem preconceitos da prática sexual

O anúncio deixara Kamona agitada. Era a primeira vez que iria aceitar sua essência submissa e, definitivamente, não tinha sido uma aceitação tranqüila. Relutara muito até decidir que sim, gostava de se submeter ao outro e que aquilo lhe dava prazer. Pesquisara bastante, conversara com pessoas do meio, trocara ideias com outras submissas e, assim, chegou ao anúncio de Cadu, um dominador experiente que, pelo que descobrira em conversas pelo MSN, compartilhava de algumas de suas fantasias, tais como podolatria, bondage [amarração], controle de orgasmos, entre outros.

 Aquele era o primeiro encontro real entre os dois. Ela sabia que já estava entregue, que já confiava nele mais do que era esperado em tão pouco tempo. Mas também, depois de horas e mais horas conversando com ele, primeiro via MSN e, depois, por telefone, não tinha como não confiar naquele homem educado, charmoso e altamente convincente. Além do mais, no questionário que enviara no seu processo de seleção, respondera coisas que nunca tivera coragem de dizer em voz alta, quanto mais contar para os outros.

 Não teve dificuldades para se arrumar. Ele deixou bem claro como ela deveria estar vestida. Chegou ao shopping com o coração a mil... tinha certeza que não conseguiria almoçar, como tinham combinado. Não demorou a encontrá-lo, sentado em uma das mesas da praça de alimentação.

 Cadu estava tranquilo. Já tinha bastante experiência como dominador e já  passara por aquilo muitas outras vezes. Aquela menina tímida passando por entre as mesas da lotada praça de alimentação do shopping não era sua primeira submissa e, com certeza, não seria a última. Sentiu uma onda de prazer ao mesmo tempo em que era atingido também por um ciúme arrebatador ao ver vários olhares masculinos em cima de sua menina. Não demorou até que ela estivesse parada à sua frente, olhando para os pés, esperando um sinal seu, para que se sentasse.

 "Kamona, para que eu te aceite como minha submissa, você precisa ter em mente que uma relação BDSM não é assim tão diferente de uma relação baunilha [forma como os SMs chamam uma relação tradicional]. A confiança é a base do relacionamento e o objetivo é sempre o mesmo: chegar a uma relação prazerosa e feliz. Eu vejo apenas como pessoas em lados opostos de um lago, cada uma olhando para o centro, sob óticas diferentes, mas com o mesmo objetivo. Numa relação entre dominador/submisso, seja em que variação for [submisso/rainha, dom/submissa, dom/submisso, rainha/submissa], cada uma das partes consegue colocar o prazer do outro à frente e entender a fantasia, se dispondo então à situação. Da mesma forma que tem gente que sente prazer sentindo dor, tem gente que sente prazer em saber que está se superando pela realização de uma fantasia da pessoa que ela escolheu como dono. Você, como minha submissa, será colocada em situações onde eu testarei seus limites o tempo todo e farei o possível para que você o supere; e é nessa superação que ambos encontraremos prazer.  No fundo acho que a diferença entre o baunilha e o SM é que nesse as coisas são transparentes. Tirando isso, as relações são bem parecidas. Numa relação baunilha, um está tentando dominar o outro o tempo todo. Quando um faz algo que sabe que irrita o outro, de alguma forma querendo mostrar que é capaz, que pode, e isso nada mais é do que um jogo de dominação, em que um está jogando com o outro por conta do poder na relação. A diferença é que no nosso caso, você está me passando esse poder de forma consensual.  Se estivéssemos em uma relação baunilha, depois de alguns encontros eu te pediria em namoro, só iríamos falar sobre sexo lá para o terceiro encontro, mesmo assim não abriríamos todas as nossas fantasias um para o outro, eu te daria um anel e depois de um tempo nós nos casaríamos, e por aí vai. Aqui, nossas primeiras conversas foram sobre sexo, tentamos ser o mais verdadeiro possível um com o outro a respeito das nossas fantasias, nós selaremos um contrato, eu te darei uma coleira e viveremos nossas fantasias sempre de forma sã, sadia e consensual, de forma que ambos alcancemos o prazer. E então, você aceita ser minha submissa?”

 _certo e errado?

Marquês de Sade costumava dizer que nada nem ninguém é mais importante do que nós mesmos. E que não devemos negar-nos nenhum prazer, nenhuma experiência, nenhuma satisfação, desculpando-nos com a moral, a religião ou os costumes.

 Com isso em mente, pense rápido: vale tudo entre quatro paredes? Existe o "normal" e o "anormal" quando o assunto é sexo? Padrões precisam ser seguidos na hora H? Quem determina o que é "certo" ou "errado" quando o assunto é o nosso próprio prazer?

 No Império Romano, tudo era permitido quando o assunto era sexo. Não existiam proibições e a busca pelo prazer era o que guiava as pessoas. Quando Constantino aliou-se à Igreja Católica, no ano 312, as coisas começaram a mudar. Passou-se a se preocupar mais com a virtude, com a busca de uma vida moralmente satisfatória, que fizesse da pessoa uma forte candidata a um lugar no céu. Dessa forma, passou-se a pregar a virgindade, a busca do prazer espiritual em detrimento do carnal. Passou-se a considerar certas práticas aceitáveis, enquanto outras eram moralmente condenáveis. Santo Agostinho chegou a escrever que o único sexo permitido era aquele feito com o homem em uma posição superior, com a mulher deitada e ele por cima e, mesmo assim, apenas depois do casamento e para fins de procriação.

 Mas como em toda convenção existem pessoas que não concordam com o que é  imposto. Algumas simplesmente não se adaptam àquilo que a sociedade prega como "certo" e, partem então, em busca daquilo que as farão felizes, tornando-se assim, muitas vezes por ignorância e hipocrisia dos outros, vítimas de preconceitos. É certo abrir mão da sua essência, daquilo que lhe dá prazer por imposições de terceiros? Algumas pessoas acham que sim, outras saem do padrão, em busca daquilo que crêem que as fará plenamente realizadas.

 Entrevista Mestre K@ e kalía

O mundo BDSM

Numa segunda-feira à noite me vi numa das discussões mais prazerosas que já tive no MSN e, o mais incrível, com três pessoas completamente desconhecidas. O assunto? Relações BDSM [o termo vem do inglês e compreende práticas físicas ou psicológicas que se complementam: B & D: Imobilização/Bondage e Disciplina; D & S: Dominação e Submissão e S & M: Sadismo e Masoquismo].

 Tudo o que eu sabia sobre o assunto vinha de algumas histórias que eu já havia lido com personagens dominadores e submissos. Confesso que tinha algumas imagens pré-estabelecidas, de pessoas vestidas de couro, dominadores com chicotinhos na mão e submissas apenas dizendo "sim senhor", sem qualquer tipo de vontade própria. Ledo engano! Assim como em qualquer relação humana, há de tudo, para todos os gostos. Médicos, advogados, professores, jornalistas, bancários, arquitetos... qualquer um é bem-vindo, desde que queira vivenciar aquilo que realmente lhe dá prazer. Sem máscaras.

 Ele está  no BDSM há dez anos. Como várias das pessoas que vivem neste meio, começou lendo muito na internet, entrando em chats sobre o assunto até partir para as práticas reais. Mestre K@ como é conhecido, é Dono do Reino de K@ (um lugar imaginário criado para dar forma a sua fantasia), onde possui cinco submissas ou "eskravas". Suas fantasias? Podolatria [gosto por pés, tanto para cuidados como para castigos] e ser dono de várias submissas. Leia abaixo a entrevista que ele concedeu à Paradoxo.

 Revista Paradoxo - Como você  define o BDSM?

Mestre K - Um jogo erótico sexual, baseado na troca consentida de poder, em que uma pessoa tem o desejo de controlar outra e esta sente prazer em ser controlada.

 RP - Como você  descobriu esse universo?

MK - Descobri o SM com 37 anos, lendo uma reportagem sobre fetiches, em especial sobre podolatria, na revista Playboy. Como sempre fui apaixonado pelos pés femininos e a matéria sugeria alguns links para pesquisar mais sobre o assunto, fui à internet e, depois de clicar em dois ou três sites sugeridos, acabei descobrindo o assunto e aí ganhei o mundo.

 RP - Como você  se descobriu um dominador?

MK - Desde criança sempre fantasiei estar mandando nas minhas amigas. Lembro-me que com 8 anos, tinha três amiguinhas que sentavam na primeira fila da sala de aula; eram todas patricinhas e bem chatinhas. Eu me lembro de ficar fantasiando que se pudesse mandar nelas ia fazer com que elas sofressem bastante, até aprenderem a ficar menos frescas. Talvez, exatamente por este meu caráter formador, acabei escolhendo o título de Mestre.

 RP - O que é ser um dominador?

MK - É ter o desejo de exercer o controle, de forma séria e responsável, sobre uma ou mais pessoas, com o consentimento delas.

 RP - Você  começou como submisso ou sempre soube que era um dominador?

MK - Quando conheci o assunto, logo me identifiquei como dominador, mas depois de um ano, decidi conhecer o papel submisso. Tornei-me escravo de uma rainha por um ano. Mas já faz oito anos que entendi que o papel com que me identifico é o de dominador.

 RP - Qual o grande prazer por trás de cada uma dessas essências? E existe alguma dor?

MK - Como submisso, não curtia a dor. Meu maior prazer estava em vencer os desafios e as situações complicadas que a minha rainha me colocava. Aquele lance de poder olhar para trás e dizer, eu consegui, me superei!

 RP - Já  quis sair desse universo e viver uma relação baunilha?

MK - Às vezes, quando as relações não dão certo como desejamos, é normal pensarmos em deixar tudo, mas logo as coisas se acalmam e estamos de novo na busca por um novo relacionamento.

 RP - Qual é, para você, a característica mais importante de uma submissa?

MK - Entrega, vontade de viver em sintonia com a minha fantasia.

 RP - O que você  não suporta numa submissa?

MK - A falta de transparência. Ela continuar usando no SM as máscaras, que muitas vezes, somos obrigados a usar no nosso dia a dia. Ninguém está  no SM obrigado; cada um escolhe o papel que melhor lhe veste, então não vejo motivo para a falta de transparência.

 RP - Como evitar que uma relação D/S acabe se tornando uma relação de humilhação?

MK - Com muito respeito entre os envolvidos. Perceba que quando uma escrava diz que gosta de ser humilhada, essa humilhação está ligada a coisas muito específicas, tipo ser chamada de "vadia", "cadela" entre outras. No fundo há de se entender também que o que é humilhação para uma pessoa não é para outra, por exemplo: se uma rainha manda um escravo ajoelhar-se e beijar seus pés, não tem nada de humilhação para um escravo que gosta de pés, já para uma pessoa que não gosta pode ser algo extremamente humilhante.

 RP - Alguma sub sua já usou a safeword (palavra de segurança que interrompe a cena)? Como isso funciona?

MK - Várias vezes. Eu entendo a safeword como uma forma de a submissa dizer "eu não estou aguentando esta cena", quer seja física ou psicologicamente, ou então "hoje eu não estou legal para continuar esta brincadeira". Claro que o dominador sempre percebe quando pode ir adiante. Muitas vezes a mulher tem a sensibilidade alterada e pode não aguentar fazer algo que já fez anteriormente até de uma forma muito mais intensa. Acredito que aqui vale uma analogia. Quantas vezes, numa relação baunilha, um quer fazer sexo e o outro não está muito bem, fica fácil saber que não dá para seguir adiante na tentativa; se o fizer, como no mundo baunilha não há safeword, é confusão na certa!  Da mesma forma acontece no SM, o dominador consciente sabe se dá ou não para ir adiante.

 RP - Como é a questão do sentimento numa relação SM? Qual o sentimento que você tem pelas suas subs? Tem como não gostar mais de uma do que da outra, de tratá-las todas da mesma maneira?

MK - Amo todas as minhas escravas. Acho todas maravilhosas por sua força e entrega. Claro que numa relação com seis pessoas, eu e cinco escravas, é natural que se tenha mais empatia por uma ou por outra em determinada situação. Sou pai, tenho o mesmo amor por meus filhos, mas isso não impede que em situações diferentes eu tenha mais empatia ou facilidade de agir com um dos meus filhos. Quando começo uma relação faço questão de frisar que as escravas são diferentes, únicas, com expectativas diferentes e por isso não tem como tratá-las da mesma maneira. Aprendi que o importante não é a escrava ser exclusiva, mas sim, ser única aos olhos de seu dono. Isso as fazem fortes para lidar com as dificuldades.

 RP - Você  é sempre o mesmo com cada uma delas ou o dom muda também em função das fantasias e desejos das suas subs?

MK - Costumo dizer que escolhi um nickname diferente para cada uma delas exatamente porque cada uma é única para mim. Então a forma de tratar, as exigências e as concessões são também diferentes.  Acho engraçado ver uma mulher de 40 ou 50 anos agir como uma adolescente de 15 ao dizer coisas do tipo: "ah, mas por que a fulana pode e eu não?" As pessoas são e têm necessidades diferentes.

 RP - Sabe-se que nem sempre as cenas terminam em sexo. Por trás disso está  o conhecimento do seu próprio corpo e a descoberta de que não se precisa do sexo para se ter prazer? Quando o sexo é necessário?

MK - Se olharmos o sexo apenas como penetração, a maioria das cenas acabam sem sexo. Ao se permitir viver suas fantasias, passa-se a conhecer melhor e a descobrir prazeres que até então eram desconhecidos. Já vi mulheres masoquistas terem verdadeiros orgasmos apenas sendo açoitadas, para elas o prazer veio da dor, naquele momento, e a última coisa em que pensaram foi no sexo convencional.

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 Ela pode ser sua vizinha, irmã, amiga, professora. Quem a vê andando por aí não imagina que por trás daquela mulher trabalhadora e super carinhosa, há uma essência submissa, que ela aceita viver há quatro anos e meio. Em um papo aberto, kalía * K@ * conta como se deu a aceitação dessa  sua essência e porque, em pleno século XXI, se submete a alguém.

 Revista Paradoxo - Como você  define o BDSM?

Kalía - Um estilo de vida em que os parceiros buscam prazer erótico, não propriamente sexual, por meios de práticas que envolvem domínio e submissão, sadismo e masoquismo.

 RP - Como você  descobriu esse universo?

K - Meus primeiros ensaios foram no final de 2001 quando conheci o SM por meio das salas de chat do UOL. A partir daí comecei a pesquisar na internet, li livros conversei com algumas pessoas da área da saúde e fui me envolvendo. Da virtualidade veio a necessidade de conhecer de perto essas práticas e aqui estou até hoje.

 RP - Como você  se descobriu uma submissa?

K - Na verdade no início das minhas atividades SM eu não estava à procura de nada, só queria conhecer e entender. Sou ávida por conhecimentos e gosto de entender, sobretudo, coisas que me instigam e assim foi com o SM. Eu achava interessante os dois lados do chicote, mas o grande fator que definiu minha preferência pela submissão foi a minha personalidade forte, definida de mulher segura, bem resolvida profissionalmente, com uma família maravilhosa.

 RP - O que é ser uma submissa?

K - Submissão e entrega não são atitudes impostas, são intrínsecas. Nenhum dominador faz uma submissa, mas tem a capacidade de burilá-la, se ela já tem a predisposição de servir. O Mestre não me “fez” submissa; ele me deu elementos significativos para que eu chegasse a ser o que sou hoje e cheguei por livre vontade. E isso ele faz com todas as escravas. Cada uma responde de forma diferente, nenhuma entrega é igual, mas condicionada aos interesses e motivações de cada uma.  Penso que um dominador jamais constrói uma submissa, ou um sádico uma masoquista. Quem constrói essas personagens somos nós mesmas! Se você não se identifica com esse modo de vida, mas quer agradar, pode até tentar por um tempo, mas não sempre. Se não curte se submeter e o faz por falta de opção, vai acabar cometendo uma agressão íntima consigo mesma.

 RP - Já sentiu medo alguma vez? Como fazer nesses casos?

K - Já senti mais do que medo, senti pavor, vontade de desaparecer de certas situações. A única coisa que se tem a fazer é tentar manter o controle, se for medo de práticas físicas, eu tenho minha safe e posso usá-la; se for psicológicas é um pouco mais complexo, pois nem sempre sabemos mensurar o momento de pedir a safe, pois a tentativa de superação é grande, mas o que sempre faço é projetar-me no Mestre e tentar captar o prazer dele para aliviar o meu sofrimento e disso nasce o meu prazer.

 RP - Muitas pessoas acham que uma relação D/S pode ser algo próximo a um conto de fadas, já que se tem um dono que cuida de você  e do seu prazer. Você pode relatar algum caso que mostre que nem sempre é assim?

K - (Risos...) Primeiro é preciso saber que tipo de gente pensa assim. Praticantes sérios de BDSM sabem o que é uma relação D/S. Curiosos que se autodenominam praticantes podem pensar assim, uma vez que não conhecem nossas práticas. Relação D/S não tem como definição o dono cuidar da submissa e de seu prazer, pelo contrário, o prazer dele é, muitas vezes, fazê-la sofrer, passar por humilhações, receber castigos, Ele impõe sua vontade sobre a dela. Esse conjunto de práticas e ações deve ser prazeroso para a submissa. Em qualquer relacionamento sério o que acontece é isso. Não significa, no entanto, que sempre somente a vontade do dono prevalece... Ele também procura agradar sua submissa, afinal é uma troca, desde que não fira os a essência da fantasia dele.

 RP - Já quis sair desse universo e viver uma relação baunilha?

K - Momentos de crises todos nós temos, mas vontade concreta de sair do SM até o momento não. Se essa vontade aparecer é porque perdi o tesão pelo SM, o que acho difícil.

 RP - Por que ser uma submissa?

K - Por opção, por livre escolha, pela confiança em tenho em quem me conduz. O fato de eu, como mulher impulsiva, quase explosiva [risos] e determinada, estar totalmente entregue nas mãos de outra pessoa, fazendo exatamente o contrário do que sempre fiz, foi um grande desafio e quis comprá-lo. Viver a submissão só me proporcionou mais equilíbrio. Melhorei muito como pessoa depois que entrei no SM.

 RP - Além de submissa, você é também dominadora. Como se desligar de sua essência submissa num momento de dominação?

K - Essa versatilidade de viver os dois papéis foi construída a partir da fantasia do mestre. Ele aproveitou uma tendência natural que eu tinha e modelou-me ao seu bel prazer. Fez-me dominadora e sádica, uma vez que o ápice da fantasia dele é ver uma mulher dominar outra, sendo ele o centro de tudo. Por conta disso é fácil separar a submissão da dominação. Eu encaro o meu papel projetado no treinamento que ele fez comigo. Agora quanto aos escravos que tive, isto foi um deleite à parte. O prazer pelo sadismo tomou forma e o mestre sentiu que eu estava preparada para ousar mais. Ele se encanta de ver suas mocinhas dominando escravos, sendo usados por elas, mas sem jamais tê-las de fato, pois a pertença é exclusiva do mestre.

 RP - Seu mestre tem outras submissas além de você. Como é a relação entre as submissas? Como lidar com o ciúme? Ele existe?

K - Óbvio que existe, somos submissas, mas antes somos mulheres e bem passionais... [risos]. Não existe submissa que não tenha ciúme. O cuidado, a atenção, o zelo, o sadismo e dominação na hora certa do mestre encantam sobremaneira, então, ficamos como mariposas em volta da luz. Ele é um, nós somos muitas; lidar com os momentos em que somos preteridas e outras preferidas não é fácil, mas é exatamente isso que mexe com ele. O que fazemos é contornar a situação. Tem época que fica mais difícil, têm submissas que nos incomodam mais, outras menos... Mas nesses quatro anos e meio que estou no reino tenho conseguido vencer meus impulsos, nada que um belo castigo não resolva rapidinho...[risos].

 RP - Que conselho você daria para alguém que quer entrar nesse universo. Como evitar uma roubada?

K - Primeiro deve-se saber realmente o que se quer, segundo não ser uma pessoa que está buscando o SM como fuga, pois se for assim será presa fácil nas mãos de pseudodominadores. E, por último, saber escolher alguém que se identifique com a sua fantasia, caso contrário, deixa de ser prazer e passa a ser uma angústia viver o SM.

 RP - Sua família sabe da sua escolha? Como esconder isso da sociedade em geral?

K - Minha família sabe, mas faz vista grossa, eu respeito a recusa íntima deles e eles respeitam minha opção de vida. Não tenho porque alardear minha vida privada; não pratico nada de SM em público baunilha, cada um vive o que quer. A quantidade de gente conhecida e famosa, até pessoas de excelente posição social, que vive o SM é bastante significativa. Profissionais liberais, políticos, cantores, atores e atrizes de cinema e televisão... E muitos não se intimidam se são descobertos. Assim como os homossexuais ganharam a luta para não serem considerados doentes, também os sadomasoquistas lutam por isto. Felizmente está sendo revisto o código das doenças e há um movimento significativo em prol da retirada das opções sexuais da lista de doenças do Código Internacional de Doenças CID 10 (inclui o sadomasoquismo), criado em 1992 que compara nossas práticas a pedofilia e necrofilia. Isto sim é um acinte!

 RP - Em algum momento você se arrependeu de ter feito essa escolha de vida?

K - Tive momentos de crise, mais por formação cultural e religiosa do que por convicção, mas em momento algum me arrependo da minha escolha. Sou muito feliz assim e quero continuar por muitos anos ainda. Como sempre digo para o mestre: ainda hei de apanhar de bengala [risos].

 Mitos sobre o BDSM

O mundo BDSM

Pedimos ao Mestre K@ para comentar os principais mitos que envolvem o BDSM. Veja o que ele diz sobre o assunto.

 Mito 1: Toda pessoa que se envolve no BDSM gosta de dor.

Não. As motivações são as mais diversas possíveis, tais como: servir, ser imobilizada, superação etc.

 Mito 2: Dominadores são sempre do sexo masculino e submissas do sexo feminino.

Não. Existem também um grande de número de rainhas e escravos e também de relações entre dominadores/escravos e dominadoras/escravas.

 Mito 3: Relações BDSM são sinônimo de sexo fácil.

Não. Apesar de estar cada vez mais comum no SM, com o crescimento da internet, o aparecimento de pseudodominadores que tentam usar o SM para realizar suas fantasias sexuais de estar com mais de uma mulher, mas estes não conseguem ir além de algumas vivências frustradas, pois as pessoas que levam o SM a sério sabem bem o que buscam.

 Mito 4: O dominador sente prazer em humilhar seu submisso.

Usualmente a humilhação faz parte do jogo SM e o dominador sente prazer em submeter sua propriedade, sim. No entanto, é preciso ter em mente que isso só é possível se a humilhação não for um limite para o submisso. O que muitas vezes ocorre é que por dominação psicológica o dominador pode conseguir essa superação, mas com muita cautela e cuidado.

 Mito 5: Para haver verdadeira relação BDSM, na sua forma mais pura, não pode existir o amor entre os parceiros.

Claro que não. A relação BDSM é quase sempre muito mais intensa do que uma relação baunilha. O amor existe e é por demais intenso e esse sentimento até favorece a entrega plena do submisso. O que não existe é a associação de que esse amor tenha que, obrigatoriamente, acabar num casamento.

 Mito 6: Toda relação BDSM se dá da mesma forma, com chicotes, correntes, tapas e dor.

Não. Cada relação é única, o que é bom para um não é, obrigatoriamente, para o outro. Existem práticas que são desejadas no começo, mas depois de experimentá-las perde-se o interesse; outras proporcionam prazer depois da superação. Fazendo uma analogia ao sexo no mundo baunilha, são várias as maneiras de fazê-lo. Não existe nada que diga que a posição papai-mamãe ou a da colher é a certa.

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